“Recomeça… se puderes, sem angústia e sem pressa e os passos que deres, nesse caminho duro do futuro, dá-os em liberdade, enquanto não alcances não descanses, de nenhum fruto queiras só metade.”
Miguel Torga

sexta-feira, 9 de dezembro de 2005

Poesia IV

O Menino da Sua Mãe

No Plaino abandonado

Que a morta brisa aquece,
De balas traspassado
- Duas, de lado a lado -,
Jaz morto, e arrefece.


Raia-lhe a farda o sangue.

De braços estendidos,
Alvo, louro, exangue,
Fita com olhar langue
E cego os céus perdidos.

Tão jovem! que jovem era!

(Agora que idade tem?)
Filho único, a mãe lhe dera
Um nome e o mantivera:
"O menino da sua mãe".

Caiu-lhe da algibeira

A cigarreira breve.
Dera-lhe a mãe.
Está inteira
E boa a cigarreira.
Ele é que já não serve.

De outra algibeira, alada
Ponta a roçar o solo,
A brancura embainhada
De um lenço... Deu-lho a criada
Velha que o trouxe ao colo.

Lá longe, em casa, há a prece:

"Que volte cedo, e bem!"
(Malhas que o Império tece!)
Jaz morto, e apodrece,
O menino da sua mãe.

(Fernando Pessoa)

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